Uma música por dia
#2 Mission of Burma (Boston/Massaxuxas/ Mérica )
Há
colectivos com biografias madrastas. Demasiado à frentes do tempo,
demasiado incompreendidos, um infortúnio ou uma tragédia, "and
its all over". Os Mission of Burma são verdadeiros campeões
dessa liga.
"Bad
timing" e tudo se resume a isso. Quando surgiram, o sistema de
suporte do "underground" norte - americano da era Reagan ainda não
existia. Não importaria o quão brilhantes fossem. Havia poucos
clubs onde podiam tocar, poucas rádios que lhes dessem "airplay",
poucas "zines" que escrevessem sobre eles e poucas lojas de
discos independentes.
Pegando
em elementos de "free jazz", psicadelia e música
experimental (Bob Weston, o Sancho Pança de Steve Albini, manipulava
cassetes em tempo real, a partir da mesa de mistura nos concertos) e
injectando-os no que se apelida de "anthemic punk rock". Na
opinião de um crítico, eles seriam "avant-garde music you
could shake your fist to".
No
fundo, a primeira banda de post-punk norte americana. Os Wire de
Boston.
Tudo
isto apenas com um single ("Max Ernst"), um ep ("Signals,
Calls and Marches") e um super-influente disco ("Vs")
que abre a estrada para Sonic Youth e toda a vaga sónica de
guitarras e ritmos angulares. E tudo isto entre 1979 e 1983.
Com
um culto significativo na zona de Boston, mas um quase total
desconhecimento no resto do mundo, os Mission of Burma tiveram um
percurso completamente errático (um exemplo é a tour que fazem no
Inverno de 1980 em que aproveitando uma promoção da Eastern
Airlines de 300 dólares/all you can fly in a month in the USA ,
fazem 22 dias e 15 shows por todos os Estados Unidos. O único
problema? Tinham sempre de fazer escala em Atlanta, por isso por mais
curtas que fossem as distâncias, como por exemplo Seattle- San
Francisco, o avião tinha de vir sempre primeiro à Georgia),
pontuados por concertos onde estava mais banda do que público (e
eles eram apenas 3), festas de palhaços com cartazes a pedir-lhes
para parar, ou ainda terem o baixista dos R.E.M. a correr atrás da
"tour van" deles, qual fã histérica.
Em
1983 terminaram, quando o circuito "underground" do indie
norte-americano se estava a pavimentar com as tours insanas de Black
Flag e Minutemen (por indie entende-se mesmo música independente,
não confundir com o outro género que se cinge apenas ao estético)
e o seu nome começava a tornar-se frequente de ouvir, como
referência em entrevistas de outras bandas.
O
"tinnitus" do guitarrista Roger Miller, amplificado por uma
adolescência em Ann Harbour a ouvir os heróis locais, Stooges e MC5
no máximo, juntando a isso performances ao vivo com o volume do
amplificador de guitarra a bater no vermelho, finalizaram com a banda.
Em
2002 regressaram, mas com bastas condições. Miller hoje em dia tem
de tocar com um auricular de tiro, o amplificador à sua frente e um
vidro entre ele e o baterista. Ao mínimo ruído, o seu "tinnitus"
pode voltar ao seu estado normal que é um "piiiiiiiiiiiiiiii"
eterno. Foi nessas condições que os vi em Serralves, a abrir para
Shellac, num concerto que coloco facilmente no meu top 10 .
Completamente essenciais.
http://www.youtube.com/watch?v=aQVZaeEmkOA "Thats how i escaped my certain fate" - de "Vs", 1982
-http://www.youtube.com/watch?v=Qpi2DefuyJ4 o "último" concerto em Boston, 1983. "Trem Two" com direito a estranhas danças e stage-diving.
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