sexta-feira, 23 de agosto de 2013


Uma música por dia

#2 Mission of Burma (Boston/Massaxuxas/ Mérica )

Há colectivos com biografias madrastas. Demasiado à frentes do tempo, demasiado incompreendidos, um infortúnio ou uma tragédia, "and its all over". Os Mission of Burma são verdadeiros campeões dessa liga.
"Bad timing" e tudo se resume a isso. Quando surgiram, o sistema de suporte do "underground" norte - americano da era Reagan ainda não existia. Não importaria o quão brilhantes fossem. Havia poucos clubs onde podiam tocar, poucas rádios que lhes dessem "airplay", poucas "zines" que escrevessem sobre eles e poucas lojas de discos independentes.
Pegando em elementos de "free jazz", psicadelia e música experimental (Bob Weston, o Sancho Pança de Steve Albini, manipulava cassetes em tempo real, a partir da mesa de mistura nos concertos) e injectando-os no que se apelida de "anthemic punk rock". Na opinião de um crítico, eles seriam "avant-garde music you could shake your fist to".
No fundo, a primeira banda de post-punk norte americana. Os Wire de Boston.
Tudo isto apenas com um single ("Max Ernst"), um ep ("Signals, Calls and Marches") e um super-influente disco ("Vs") que abre a estrada para Sonic Youth e toda a vaga sónica de guitarras e ritmos angulares. E tudo isto entre 1979 e 1983.
Com um culto significativo na zona de Boston, mas um quase total desconhecimento no resto do mundo, os Mission of Burma tiveram um percurso completamente errático (um exemplo é a tour que fazem no Inverno de 1980 em que aproveitando uma promoção da Eastern Airlines de 300 dólares/all you can fly in a month in the USA , fazem 22 dias e 15 shows por todos os Estados Unidos. O único problema? Tinham sempre de fazer escala em Atlanta, por isso por mais curtas que fossem as distâncias, como por exemplo Seattle- San Francisco, o avião tinha de vir sempre primeiro à Georgia), pontuados por concertos onde estava mais banda do que público (e eles eram apenas 3), festas de palhaços com cartazes a pedir-lhes para parar, ou ainda terem o baixista dos R.E.M. a correr atrás da "tour van" deles, qual fã histérica.
Em 1983 terminaram, quando o circuito "underground" do indie norte-americano se estava a pavimentar com as tours insanas de Black Flag e Minutemen (por indie entende-se mesmo música independente, não confundir com o outro género que se cinge apenas ao estético) e o seu nome começava a tornar-se frequente de ouvir, como referência em entrevistas de outras bandas.
O "tinnitus" do guitarrista Roger Miller, amplificado por uma adolescência em Ann Harbour a ouvir os heróis locais, Stooges e MC5 no máximo, juntando a isso performances ao vivo com o volume do amplificador de guitarra a bater no vermelho, finalizaram com a banda.


Em 2002 regressaram, mas com bastas condições. Miller hoje em dia tem de tocar com um auricular de tiro, o amplificador à sua frente e um vidro entre ele e o baterista. Ao mínimo ruído, o seu "tinnitus" pode voltar ao seu estado normal que é um "piiiiiiiiiiiiiiii" eterno. Foi nessas condições que os vi em Serralves, a abrir para Shellac, num concerto que coloco facilmente no meu top 10 . Completamente essenciais.

 http://www.youtube.com/watch?v=aQVZaeEmkOA "Thats how i escaped my certain fate" - de "Vs", 1982

-http://www.youtube.com/watch?v=Qpi2DefuyJ4  o "último" concerto em Boston, 1983. "Trem Two" com direito a estranhas danças e stage-diving.

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